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A Revolução Francesa 03 – As Pompas de uma Rainha Extravagante – Jean Plaidy

Poucos mantêm uma atitude de imparcialidade para com Maria Antonieta. Na época de sua morte, Antonieta foi comparada com Messalina e Agripina. Mais tarde, com a volta da Monarquia, tornou—se a rainha martirizada , e falava—se dela quase como se fosse uma santa. Obviamente, o retrato verdadeiro não é nenhum dos dois extremos. Quando comecei a procurar pela verdadeira Maria Antonieta, inicialmente tive a impressão de ver emergir de minha pesquisa uma mulher não muito inteligente, cuja maior preocupação era glorificar sua própria beleza e se dedicar imprudentemente à busca de prazeres, quase estúpida emsua incapacidade de ver a sombra da revolução avultando—se, mas ainda assim generosa e bondosa — ou seja, um ser humano muito comum. Mas o que fascina em Maria Antonieta é a emergência súbita da mulher corajosa e nobre que praticamente da noite para o dia tomou o lugar da frívola. É difícil crer que a borboleta de Trianon seja a mesma mulher que suportou estóica seus sofrimentos no Templo e no Conciergerie, uma mulher preocupada mais com o marido e os filhos do que consigo mesma, uma mulher mergulhada num estado de agonia mental e física enquanto mantinha sua coragem e realeza ao ser conduzida numa carroça até a Place de la Révolution. Tentar entender esta mulher e sua personalidade dúbia foi um prazer envolvente, no qual fui ajudada pelas seguintes obras: The Hístory ofFrance. M. Guizot Paris in the Revolution. G. Lenôtre. Traduzido do francês para o inglês por H. Noel Williams. The French Revolution. Thomas Carlyle. Queen ofthe Tríanon. lan D. B. Pikington. Marie Antoinetíe. Stefan Zweig. The History ofthe French Revolution. Louis Adolphe Thiers. Traduzido, com anotações, por Frederick Shoberl.


OldParís, Its Courts andLiterary Salons. Catherine Charlotte, Lady Jackson. Marie Antoinette. Hilaire Belloc. The Dauphin. J. B. Morton. Louis XVI and Marie Antoinette Before the Revolution. Nesta H. Webster. A Friend of Marie Antoinette. Frédéric Barbey. The French Revolution. Nesta H. Webster. I A Arquiduquesa em Schónbrunn — Ao que parece, madame, finalmente recebemos o que pode ser considerada uma oferta firme da parte de Sua Mui Cristã Majestade — disse o príncipe von Kaunitz. Maria Teresa, imperatriz da Áustria, conteve o sorriso de triunfo que ameaçava aflorar aos seus lábios. Se Kaunitz não estava equivocado, este era um dos momentos mais felizes de sua vida. Mas ela temia que lhe restasse pouca felicidade. Estava na casa dos cinquenta e não acreditava que tinha muitos anos de vida pela frente. A regência de um império e a glorificação da Casa de Habsburg tinham exigido muito de sua argúcia natural, e seu senso de dever insistira que ela cumprisse todas as suas obrigações. Contudo, começava a perceber que era uma mulher fragilizada. Finalmente compreendia que uma mulher que dedica todos os seus pensamentos aos deveres do estado sente muita falta dos prazeres da vida em família; e Maria Teresa, arguta governante de um império, foi tomada por um desejo repentino por emoções mais suaves. O desejo foi efémero.

Se Kaunitz tinha razão, e o velho Luís realmente estava falando sério sobre casar seu neto com a filha mais nova de Maria Teresa, então não havia espaço para qualquer emoÇão além de alegria. — Já vimos muitas promessas não serem cumpridas — disse ela. Kaunitz meneou a cabeça, concordando. — Mas não devido aos servos de Vossa Excelência na Corte da França. Eles sempre trabalharam assiduamente para cumprir vossos desejos. Quase nunca se passou um dia sem que alguma alusão tenha sido feita ao rei ou à arquiduquesa. Madame, Sua Majestade foi posta a par das qualidades encantadoras de sua filha. Maria Teresa sorriu ternamente. — Ela fica mais bonita a cada dia que passa. Tenho certeza de que se pudesse vê—la, o rei ficaria encantado. — E, mesmo em sua idade, Sua Mui Cristã Majestade é muito suscetível à beleza feminina, madame — acrescentou Kaunitz com um sorriso. A imperatriz franziu a testa. Era indigno discutir escândalos reais com servos, mas ao mesmo tempo era necessário saber tudo que transcorria em cortes rivais; e ela conhecia a vida bem o bastante para entender que as alcovas dos monarcas muitas vezes eram as estufas nas quais grandes eventos eram plantados e regados. Isto se aplicava particularmente à Corte da França. Ao longo dos séculos, os monarcas franceses tinham sido mais suscetíveis aos encantos femininos do que os outros reis. Na França era quase uma tradição que a amante do rei fosse a pessoa mais importante na Corte. Incomodava—a saber que o monarca sensualista substituíra madame de Pompadour por madame du Barry que era, segundo reportavam muitas fontes, uma mulher do povo, uma nova—rica que emdeterminado ponto de sua carreira fora prostituta de classe baixa. E era essa Corte — a mais deslumbrante e também a mais cínica do mundo, regida por uma prostituta e por um sátiro envelhecido em busca contínua por novas sensações — à qual ela teria a felicidade de enviar sua filhinha de quatorze anos, a belíssima e encantadora Maria Antonieta. Como Kaunitz era um servo de confiança, a imperatriz colocou sua preocupação em palavras: Creio que Sua Majestade da França não demonstraria nada além de admiração respeitosa pela esposa de seu neto. — Com toda certeza, madame. — E quanto ao delfim? Maria Teresa percebeu a expressão preocupada no rosto de Kaunitz. O delfim, o neto de Luís XV da França, era um menino tímido que gostava de se isolar dos outros; não era exatamente estúpido, mas era tão nervoso que assim parecia. O fato de que um dia ele ascenderia ao trono — umdia muito próximo, porque Luís XV contava sessenta anos e não tinha filho para sucedê—lo —parecia, ao invés de inspirá—lo, enchê—lo de medo do futuro. Apesar de toda a sua importância, apesar de ser herdeiro de um dos tronos mais cobiçados da Europa, o jovem delfim Luís, duque de Berry, era uma criatura infeliz, e os relatos grandiosos das pessoas ansiosas por promover o casamento não podiam ocultar isso completamente. — Ele é jovem — disse agora Kaunitz.

— Pouco mais que um menino. O delfim não tinha ainda dezesseis anos. Maria Teresa disse a si mesma que devia estar satisfeita por ele não ser parecido com o avô. De uma coisa ao menos ela podia ter certeza: sua filha não precisaria seguir as ordens das amantes do marido, sina compartilhada por muitas rainhas da França. — O delfim vai crescer — disse ela com firmeza, e se recusou a se preocupar com ele. Esse casamento era a coisa que Maria Teresa mais desejava no mundo. Era necessário para a Áustria. Precisava haver paz entre a Áustria e sua inimiga antiga, a França. Habsburg e Bourbon precisavam dar—se as mãos e permanecer juntos neste mundo em mudança. Aquela ilhazinha nas proximidades da costa da Europa estava ficando poderosa demais. Era evidente que aquela comunidade protestante de ilhéus já contemplava a aquisição de um império que excederia em poder todos os outros. Um mundo em mudança exigia que velhos inimigos formassem novas alianças. Kaunitz prosseguiu: — E Sua Majestade já escolheu a data. Ele sugere a Páscoa como uma boa época para o casamento. — Concordo inteiramente. Na Páscoa, quando o ano ainda é jovem. Teremos tempo suficiente para os preparativos. Ela estava sorrindo, determinada a esquecer suas preocupações com este casamento. Também esqueceria suas ansiedades quanto ao seu filho Joseph, a quem tornara co—regente alguns anos antes, e cuja cabeça parecia cheia de planos loucos que ela temia serem destinados ao desastre. Esqueceria de Maria Amália, sua filha, a quem entregara em casamento ao duque de Parma e que já estava, com sua leviandade, suscitando fofocas escandalosas. Esqueceria todos os filhos que tinham— na decepcionado e pensaria apenas na caçula, a encantadora Antonieta, que faria o mais brilhante de todos os casamentos, sentaria no trono da França e firmaria a amizade entre Habsburg e Bourbon, que era tão necessária à Áustria. Dispensou Kaunitz, porque queria ficar a sós com seus pensamentos. Depois que Kaunitz saiu, a imperatriz caminhou até a janela e olhou para os jardins. Estava pensando que precisava cuidar logo dos preparativos, para não permitir ao velho Luís a oportunidade de retirar sua promessa, e que devia ficar atenta a qualquer trama articulada por seu antigo inimigo, Frederico da Prússia, que naturalmente faria tudo ao seu alcance para impedir a união. Precisava contar com a discrição de Joseph, o que era arriscado; a indiscrição era uma das características mais persistentes em sua família.

De quem herdaram isso? Não de sua mãe. Talvez de seu pai, François de Lorraine. Em todo caso, ela precisava proteger—se. Maria Teresa precisava manter—se em guarda contínua. Como ansiava por passar as rédeas do governo para o jovem Joseph! Mas como confiar em Joseph? Como permitir que ele jogasse pela janela tudo que ela tinha construído com argúcia e planejamento cuidadoso? Não, ela precisava manter—se no comando até estar certa de que seu filho tinha adquirido sabedoria e compreensão. Sentiu vontade de rir de si mesma; era uma mulher que ambicionara ser imperatriz e mãe. Quisera demais da vida. Enquanto olhava para o jardim, escutou o latido repentino de um cão correndo, passando pela fonte, sua coleira arrastando na grama. — Peguem ele! — gritou uma voz. — Peguem ele… depressa! Mops! Venha cá, Mopsee. Venha cá, estou mandando. Agora a dona da voz — uma mocinha — apareceu correndo, e a imperatriz sentiu uma emoção súbita apertar sua garganta. Era adorável, essa criança; tão jovem, tão inocente. Entre todos os meus filhos, a minha pequena Antonieta é a favorita, pensou Maria Teresa. Como é formosa! É pequena para sua idade, mas com toda certeza irá crescer. Parece uma fadinha com seus olhos azuis vivos, seus cabelos louros esvoaçantes, sua pele clara como porcelana. Decerto é a criança mais bela em todo o mundo. Fará muito sucesso na corte da França, onde a beleza feminina é tida em alta conta. — Venha cá, Mops! Não está ouvindo? A voz era aguda e imperiosa, mas ainda assim claramente dizia ao pequeno cão dinamarquês que aquilo era um jogo; ele estava tentando fugir dela enquanto ela estava tentando pegá—lo. Umjogo que parecia infantil demais para uma arquiduquesa de quatorze anos prestes a se tornar delfina da França. Agora outra figura apareceu lá embaixo. Uma das jovens criadas. Maria Teresa sabia que a jovem Antonieta escolhia seus amigos onde queria, sem considerar posição ou título. Maria Teresa não havia podado esta característica de sua filha. — Bobagem — dissera Maria Teresa.

— É bom para ela tomar suas próprias decisões. Mas será que Maria Teresa estava certa? Será que ela, tão obcecada com os assuntos do reino, havia negligenciado seus deveres como mãe? Será que era por isso que Maria Amália estava andando com amantes em Parma? Será que era por isso que Joseph parecia determinado a fazer tudo ao seu próprio modo? Em todo caso, era hora de Antonieta parar de brincar em jardins com cães e criadas. A criada ultrapassou Antonieta e conseguiu agarrar a correia amarrada à coleira do cachorro. O dinamarquês deu meia—volta e correu na direção de Antonieta, latindo alegremente. O cachorro passou por Antonieta, fazendo ambas as meninas colidirem uma com a outra e caírem esparramadas na grama. Uma visão estranha, pensou Maria Teresa. Uma criada, um cão dinamarquês e uma arquiduquesa rolando juntos na grama do jardim do Palácio Imperial. O que as damas e cavalheiros de Versalhes comentariam caso uma cena como essa lhes fosse reportada? E quem podia dizer que não seria, considerando que havia espiões por toda parte? Os espiões da própria Maria Teresa tinham assegurado que Versalhes encarava tão seriamente o protocolo que ele era mais importante que qualquer outro assunto. Um homem preferiria perder sua amante a cometer uma falha de etiqueta. O futuro de um membro da corte dependia dos atos mais triviais, de cada palavra que proferia. Maria Teresa chamou um de seus pajens. — Mande a arquiduquesa apresentar—se a mim imediatamente — comandou. A menininha estava em pé diante da mãe. Maria Teresa notou a mancha verde em seu vestido, e tentou carregar sua voz com severidade ao dizer: — Rolar na grama não é uma atividade digna da arquiduquesa da Áustria. Lembrar o episódio fez Antonieta rir. — Mamãe, foi tão engraçado. Sabe, o Mops está sempre fugindo. Ele não quer realmente fugir, mas gosta de ser caçado, e… Maria Teresa levantou uma mão. — Não tenho dúvida de que foi divertido, minha filha; mas você chegou a uma idade em que precisa pensar em coisas mais sérias do que brincar com cães. — Eu sempre vou amar os cães — declarou a menina. — E eu sempre vou brincar com eles porque, você sabe, mamãe, os cães precisam ter com quem brincar. Eles crescem infelizes se seus donos não brincam com eles. São como crianças, mamãe. Você precisa fazer com que se sintam felizes. Se não fizer isso, você se torna infeliz… e então, quando está infeliz, não vê sentido embrincar com cães.

Minha filha, minha filha! Com quantos anos você está? — Quatorze. Mas é claro que a senhora sabe disso, mamãe. — Uma menina de quatorze anos não é mais uma criança, Nieta.

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