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[Senhores do Submundo 01] – A noite mais sombria – Gena Showalter

TODA NOITE A morte chegava, lenta e dolorosamente, e toda manhã Maddox acordava na cama sabendo que, mais tarde, teria que morrer outra vez. Esta era sua maior maldição e seu castigo eterno. Ele passou a língua pelos dentes, desejando que fosse, na verdade, uma lâmina cortando o pescoço de seu inimigo. A maior parte do dia já se passara. Ele ouviu o tempo escoar com um tique-taque hostil em sua mente, e cada batida do relógio parecia zombar dele ao lembrar-lhe da mortalidade e da dor. Em pouco mais de uma hora, ele sentiria a primeira pontada no estômago e não haveria nada que pudesse fazer nem dizer para mudar isto. A morte chegaria. — Malditos deuses — ele murmurou, aumentando a velocidade do exercício de supino que estava fazendo. — São todos uns desgraçados — disse uma conhecida voz masculina às suas costas. Maddox não desacelerou os movimentos por causa da indesejada intromissão de Torin. Para cima. Para baixo. Para cima. Para baixo. Por duas horas, ele descontara sua frustração e sua raiva no saco de pancadas, na esteira ergométrica e, agora, com os pesos. O suor escorria pelos braços e peito nus, passeando pelos nós dos músculos, formando pequenos regatos. Ele devia estar tão exausto mentalmente quanto fisicamente, mas suas emoções só ficavam mais soturnas e intensas. — Você não devia estar aqui — ele disse. Torin suspirou. — Olhe, não quis interromper, mas algo aconteceu. — Então, resolva. — Não posso. — Seja o que for, tente. Não estou em condições de ajudar. — Naquelas últimas semanas, faltara muito pouco para que ele entrasse em um frenesi assassino, durante o qual ninguém à sua volta estaria seguro.


Nem seus próprios amigos. Especialmente seus próprios amigos. Ele não queria fazer isso, teve essa intenção, mas, às vezes, era incapaz de dominar o próprio ímpeto de destruir e arrebentar a tudo e a todos. — Maddox… — Estou no limite, Torin — resmungou. — Vou causar mais danos do que ajudar. Maddox conhecia as próprias limitações havia milhares de anos. Desde aquele maldito dia em que os deuses haviam escolhido uma mulher para desempenhar o papel que deveria ser dele. Pandora era forte, sim, a mais forte guerreira de sua época. Porém ele era mais forte. Mais capaz. Todavia, foi considerado fraco demais para guardar dimOuniak, uma caixa sagrada que continha demônios tão infames e destrutivos que nem mesmo no Inferno se confiaria neles. Maddox jamais teria permitido que a caixa fosse destruída. Aquela afronta fez brotar uma frustração dentro dele e de cada guerreiro que ali vivia. Eles haviam lutado diligentemente pelo rei dos deuses, matado com habilidade e garantido plena proteção; deviam ter sido escolhidos como guardas. E o fato de não terem sido era um constrangimento que não seria tolerado. Eles só haviam desejado dar uma lição nos deuses na noite em que tinham roubado dimOuniak de Pandora e libertado aquela horda de demônios no mundo, que estava alheio a tudo aquilo. Como tinham sido idiotas. Seu plano para provar seu poder fora um fiasco, pois a caixa acabara sumindo em meio à briga, o que deixara os guerreiros incapazes de recapturar um único espírito maligno sequer. Logo reinaram a destruição e o caos, e o mundo fora lançado na escuridão até o rei dos deuses finalmente intervir, lançando sobre os guerreiros uma maldição: cada um deles teria que abrigar um demônio dentro de si. Um castigo adequado. Os guerreiros haviam libertado o mal para vingar seu orgulho pungente; agora, eles o conteriam. Assim, nasciam os Senhores do Mundo Subterrâneo. Maddox recebera Violência, o demônio que agora era tão parte dele quanto seus pulmões ou seu coração. Agora, o homem não conseguia mais viver sem o demônio, e o demônio não conseguia mais agir sem o homem. Eles estavam entrelaçados, duas metades de um todo.

Desde o começo, a criatura dentro dele o incitara a fazer maldades, coisas detestáveis, e ele era forçado a obedecer. Mesmo quando levado a matar uma mulher… a matar Pandora. Seus dedos se fecharam com tanta força na barra que as juntas quase se deslocaram. Ao longo dos anos, ele aprendera a controlar algumas das compulsões mais cruéis do demônio, mas era uma luta constante, e ele sabia que podia ceder a qualquer momento. O que ele não daria por apenas um dia de tranquilidade. Sem o irresistível desejo de ferir as pessoas. Sem batalhas internas. Sem preocupações. Sem morte. Só… paz. — Aqui não é seguro para você — ele disse ao amigo, que ainda estava parado à porta. — Você precisa ir embora. — Ele pôs a barra prateada no descanso e se sentou. — Apenas Lucien e Reyes têm permissão para ficar perto de mim enquanto morro. — E somente porque eles haviam feito parte daquilo, mesmo involuntariamente. A impotência deles em relação aos seus demônios era a mesma de Maddox em relação ao que trazia dentro de si. — Falta cerca de uma hora até acontecer, então… — Torin lhe jogou um pano. — Vou arriscar. Maddox pegou o pano branco atrás de si e se virou. Enxugou o rosto — Água. Uma garrafa de água praticamente congelada foi pairando pelo ar antes que a segunda sílaba saísse de sua boca. Ele a pegou com habilidade, a umidade respingando em seu peito. Bebeu o líquido refrescante e olhou atentamente para o amigo. Como de costume, Torin estava todo de preto, e suas mãos estavam cobertas por luvas. Os cabelos pálidos caíam em ondas até os ombros, emoldurando um rosto que as mulheres mortais consideravamum verdadeiro banquete de sensualidade.

Elas não sabiam que, na verdade, ele era um diabo em pele de anjo. Mas deveriam saber. Ele praticamente cintilava de tanta irreverência, e havia um brilho profano em seus olhos verdes que indicava que ele era do tipo capaz de rir na sua cara enquanto lhe arrancasse o coração do peito. Ou de rir na sua cara enquanto você arrancasse o coração dele. Para sobreviver, ele precisava encarar as coisas com humor, sempre que possível. Todos eles precisavam. Como os demais moradores daquela fortaleza em Budapeste, Torin era amaldiçoado. Ele podia não morrer todas as noites como Maddox, mas jamais poderia tocar nenhum ser vivo, pele a pele, sem infectá-lo com a doença. Torin era possuído pelo espírito da Doença. Ele não sabia o que era ser tocado por uma mulher havia mais de 400 anos. Aprendera bem a lição quando cedera à luxúria e acariciara o rosto de uma possível amante, causando uma praga que dizimara um povoado após o outro. Um ser humano após o outro. — Cinco minutos de seu tempo — Torin disse, deixando clara sua determinação. — É só o que peço. — Acha que seremos castigados por insultarmos os deuses hoje? — replicou Maddox, ignorando o pedido. Se ele não desse abertura para lhe pedirem favores, não teria de se sentir culpado por ter de negá-los. Seu amigo soltou outro daqueles suspiros. — A nossa própria vida já deveria ser um castigo. Era verdade. Os lábios de Maddox formaram lentamente um sorriso rasgado enquanto olhava para o teto. Desgraçados. Eu os desafio a me castigarem mais. Talvez assim ele finalmente desaparecesse em meio ao nada. Entretanto, duvidava que os deuses fossem se preocupar com isto. Depois de lhe lançarem uma maldição mortal, eles o ignoraram, fingindo não ouvir seus pedidos de perdão e clemência.

Fingindo não ouvir suas promessas e barganhas desesperadas. O que mais poderiam lhe fazer, afinal? Nada poderia ser pior do que morrer repetidamente. Ou ser despojado de tudo o que era bom e certo… ou hospedar o espírito da Violência dentro de seu corpo e mente. Maddox se levantou de um pulo e jogou o pano agora molhado e a garrafa d’água vazia no cesto mais próximo. Foi até o outro lado do cômodo a passos largos e entrelaçou os dedos acima da cabeça, inclinando-se para dentro da alcova semicircular com janelas de vitrais e observando a noite através da única parte de vidro transparente. Ele viu o paraíso. Ele viu o inferno. Ele viu liberdade, prisão, tudo e nada. Ele viu… seu lar. Do alto de uma colina imponente, como aquela na qual ficava a fortaleza, era possível ter uma visão direta da cidade. As luzes cintilavam vivamente, rosadas, azuladas e purpúreas, iluminando o sombrio céu aveludado, cintilando no rio Danúbio e emoldurando as árvores cobertas de neve que dominavam a área. O vento soprava forte, flocos de neve dançavam e giravam no ar. Ali, ele e os outros tinham um pouquinho de privacidade do resto do mundo. Ali, podiam ir e vir sem ter de encarar um bombardeio de perguntas. Por que você não envelhece? Por que se ouvem gritos ecoando pela floresta todas as noites? Por que você, às vezes, parece um monstro? Dali, o povo local mantinha distância, por temor e respeito. “Anjos”, ele chegara a ouvir sussurrarem durante um raro encontro com um mortal. Se eles soubessem… As unhas de Maddox se alongaram ligeiramente, cravando-se na pedra. Budapeste era um lugar de majestosa beleza, com o charme do Velho Mundo e os prazeres da vida moderna, mas ele sempre se sentia deslocado. Desde a rua do distrito do castelo até os clubes noturnos na rua seguinte. Das frutas e legumes expostos à venda em uma ruela à carne viva exposta à venda em outra. Talvez aquela sensação de deslocamento desaparecesse se ele, um dia, saísse para explorar a cidade, mas, ao contrário dos outros, que saíam vagando quando tinham vontade, ele estava preso dentro da fortaleza e seu entorno do mesmo jeito que Violência estivera aprisionado na caixa de Pandora milhares de anos antes. Suas unhas se alongaram mais, estavam já quase como garras. Pensar na caixa sempre lhe piorava o humor. Soque uma parede, incitou Violência. Destrua alguma coisa.

Machuque. Mate. Ele adoraria destruir os deuses. Um por um. Decapitá-los, talvez. Arrancar-lhes os corações negros e podres, de uma vez por todas. O demônio rugiu em aprovação. Claro que ele está rugindo agora, Maddox pensou, enojado. Qualquer coisa com sede de sangue, a despeito das vítimas, teria o apoio daquela criatura. Com um esgar, ele lançou outro olhar revoltado para os céus. Ele e o demônio haviam sido unidos muito tempo atrás, mas ele se lembrava claramente daquele dia. Os gritos dos inocentes em seus ouvidos, humanos sangrando ao seu redor, sentindo dor, morrendo, tendo sua carne devorada pelos demônios num frenesi arrebatador. Ele só perdera contato com a realidade quando Violência fora posto dentro de seu corpo. Não houvera som algum, nem nada à vista. Apenas uma escuridão que a tudo consumia. Ele só recobrara os sentidos quando o sangue de Pandora já lhe cobria o peito, a tempo de ouvir sua última respiração em seus ouvidos. Ela não havia sido sua primeira nem sua última morte, mas fora a primeira e única mulher que conhecera sua espada. O horror de ver aquela mulher, outrora vibrante, agora derrubada, e saber que era ele o responsável… jamais conseguira abrandar sua culpa e seu arrependimento. Sua vergonha e sua tristeza. Ele havia jurado fazer o que fosse necessário para controlar o espírito a partir de então, mas já era tarde demais. Ainda mais furioso, Zeus lhe lançou uma segunda maldição: toda noite, à meia-noite, ele morreria exatamente como Pandora morrera, com uma lâmina lhe atravessando o abdômen por seis diabólicas vezes. A única diferença era que o tormento dela terminara rapidamente. O tormento dele duraria por toda a eternidade. Ele estalou o maxilar, tentando relaxar e resistir a um novo ataque de agressividade. Não que ele fosse o único a sofrer, procurou lembrar.

Os outros guerreiros tinham seus próprios demônios, literal e figuradamente. Claro, Torin era o guardião da Doença. Lucien, o guardião da Morte. Reyes, da Dor. Aeron, da Ira. Paris, da Luxúria. Por que ele não recebera aquele último demônio? Assim, poderia continuar a ir à cidade sempre que quisesse, tomar a mulher que desejasse, saborear cada som, cada toque. Em sua condição, ele jamais poderia se aventurar para muito longe. Nem podia ficar perto de mulher nenhuma por longos períodos. Se o demônio assumisse o controle, ou se ele não conseguisse voltar para casa antes da meia-noite e alguém encontrasse seu corpo morto e ensanguentado, e o enterrasse… Ou, pior ainda, o cremasse… Como ele queria que algo assim pusesse um fim à sua triste existência! Ele já teria partido há muito tempo para se deixar torrar em um buraco. Ou talvez tivesse pulado da janela mais alta da fortaleza para quebrar o crânio e esmagar o cérebro. Mas não. A despeito do que fizesse, apenas acordaria novamente, queimado e dolorido. Quebrado e destruído. — Você já está olhando pela janela há um bom tempo — Torin disse. — Não está sequer curioso para saber o que aconteceu? Maddox piscou os olhos ao ser tragado para fora de seus pensamentos. — Você ainda está aqui? O amigo arqueou uma de suas sobrancelhas negras que contrastavam flagrantemente com os cabelos branco-prateados. — Creio que a resposta para a minha pergunta é não. Ao menos já se acalmou? E ele ficava calmo de verdade? — Tão calmo quanto pode ficar uma criatura como eu. — Pare de choramingar. Tem algo que preciso lhe mostrar, e não tente dizer não desta vez. No caminho, podemos conversar sobre minhas razões para perturbá-lo. — Sem dizer mais nada, Torin deu meia-volta e saiu. Maddox ficou no mesmo lugar por vários segundos, observando o amigo sumir ao dobrar a esquina. Pare de choramingar, Torin dissera.

Sim, era exatamente o que ele vinha fazendo. A curiosidade e um estranho divertimento superaram seu humor letal, e Maddox saiu da academia emdireção ao corredor. Uma lufada de ar frio formou um redemoinho ao seu redor, carregado de umidade e dos aromas revigorantes do inverno. Ele deu uma espiada em Torin, que estava a poucos metros, e avançou, aproximando-se rapidamente. — Sobre o que é? — Finalmente algum interesse — foi a única resposta. — Se for mais um de seus truques… — Como quando Torin encomendara centenas de bonecas infláveis e as espalhara por toda a fortaleza; tudo porque Paris fora tolo o suficiente para reclamar da falta de companhia feminina na cidade. Os olhares das “damas” de plástico vinham de todos os cantos, com seus olhos arregalados e bocas obscenas provocando todos que passavam. Era o tipo de coisa que acontecia quando Torin estava entediado. — Eu não iria perder meu tempo tentando truque nenhum com você — disse Torin sem se virar para encará-lo. — Você, meu amigo, não tem senso de humor. Verdade. Enquanto Maddox seguia a passos rápidos, as paredes de pedra se expandiam nas laterais; candeeiros brilhavam, pulsando com luz e fogo, espiralando sombras e ouro. A Morada dos Malditos, como Torin apelidara o lugar, fora construída centenas de anos atrás. Apesar de terem modernizado o lugar o máximo que podiam, sua idade se revelava nas pedras esfareladas e nos pisos gastos. — Onde estão todos? — perguntou Maddox, só então se dando conta de que não vira nenhum dos outros. — Você poderia pensar que Paris teria ido comprar comida, já que nossa despensa está quase vazia e esta é a única função dele, mas não. Ele foi à procura de uma nova mulher. Maldito sortudo. Possuído pelo demônio Luxúria, Paris não conseguia levar a mesma mulher para a cama duas vezes e, por isso, seduzia uma mulher diferente, ou duas ou três, todo dia. O único ponto negativo? Se ele não conseguisse encontrar uma mulher, seria reduzido a fazer coisas em que Maddox não queria nem pensar. Coisas que levariam aquele homem, dono de temperamento afável em condições normais, a despejar o conteúdo de seu estômago no toalete. Apesar de Maddox ficar com menos inveja dele nesses momentos, ela sempre voltava quando Paris falava de alguma de suas mulheres. O roçar macio de uma coxa… o encontro de peles quentes… os gemidos de êxtase… — Aeron está… Prepare-se — Torin começou —, pois esta é a principal razão para eu ter procurado você. — Aconteceu alguma coisa com ele? — perguntou Maddox, sentindo a escuridão se abater sobre seus pensamentos e a raiva tomar conta de si. Destrua, arrebente, Violência rogava, arranhando-lhe os recônditos da mente.

— Ele está ferido? Aeron podia ser imortal, mas podia se machucar mesmo assim. Podia até ser morto; fato que todos eles haviam descoberto da pior maneira possível. — Nada disso — garantiu Torin. Aos poucos, ele relaxou, e Violência recuou gradualmente. — Então, o que foi? Está limpando a sujeira e tendo um ataque de raiva? — Todo guerreiro ali tinha responsabilidades específicas. Era a maneira que eles tinham de manter alguma ordem aparente em meio ao caos de suas almas. A função de Aeron era cuidar do serviço doméstico, coisa da qual reclamava diariamente. Maddox cuidava da manutenção. Torin brincava com ações e títulos de todos os tipos para mantê-los abastados. Lucien cuidava de toda a papelada, e Reyes lhes fornecia armas. — Os deuses… o convocaram. Maddox cambaleou, tomado momentaneamente pelo choque. — O quê? — Ele só podia ter ouvido errado. — Os deuses o convocaram — repetiu Torin pacientemente. Mas os gregos não falavam com nenhum deles desde o dia em que Pandora morrera. — O que eles queriam? E por que só estou sabendo disso agora? — Primeiro, ninguém sabe. Estávamos assistindo a um filme quando, de repente, ele se empertigou na poltrona, sem expressão, como se tivesse ficado vazio por dentro. Então, segundos depois, ele vem nos dizer que foi convocado. Nenhum de nós teve tempo de fazer nada: em um minuto, Aeron estava conosco, no outro, já não estava mais. E, segundo — Torin acrescentou quase sem fazer pausa —, eu tentei lhe contar. Você disse que não se importava, lembra-se? Um músculo tremeu debaixo do olho dele. — Deveria ter me contado assim mesmo. — Enquanto você tinha halteres à mão? Por favor… Sou Doença, não Burrice. Aquilo era… aquilo era… Maddox não queria contemplar o que aquilo significava, mas não podia impedir que os pensamentos se formassem em sua mente. Algumas vezes, Aeron, guardião da Ira, perdeu totalmente o controle de seu espírito e embarcou num rompante de vingança, castigando os mortais por seus pecados perceptíveis.

Será que agora lhe seria lançada uma segunda maldição por suas ações, como acontecera com Maddox séculos antes? — Se ele não voltar exatamente como foi, encontrarei uma forma de invadir os céus e matar todos os seres divinos que encontrar. — Seus olhos estão com um brilho vermelho — disse Torin. — Olhe, estamos todos confusos, mas Aeron vai voltar logo e nos contar o que está se passando. Muito bem. Ele se forçou a relaxar. De novo. — Alguém mais foi convocado? — Não. Lucien saiu em busca de almas. Reyes está sabem os deuses onde, provavelmente se cortando. Ele já devia ter imaginado. Apesar de Maddox passar por sofrimentos insuportáveis toda noite, sentia pena de Reyes, que não conseguia passar uma hora sequer sem se torturar fisicamente. — O que mais tinha para me dizer? — Maddox esfregou as pontas dos dedos nas duas colunas que se elevavam nas laterais da escadaria antes de começar a subir os degraus. — Acho que vai ser melhor se eu lhe mostrar. Seria algo pior do que a notícia sobre Aeron?, Maddox se perguntou, passando pela sala de entretenimento. O santuário deles. A sala, na qual não haviam poupado gastos, era repleta de móveis elegantes e todos os confortos que um guerreiro podia desejar. Havia um refrigerador abarrotado de vinhos e cervejas especiais. Mesa de sinuca. Uma cesta de basquete. Uma enorme tela de plasma que, no momento, exibia imagens de três mulheres nuas no meio de uma orgia. — Vejo que Paris esteve aqui — disse ele. Torin não respondeu, mas apertou o passo, sem olhar nem por um segundo para a tela. — Esqueça — murmurou Maddox. Fazer Torin prestar atenção em qualquer coisa de natureza carnal era de uma crueldade desnecessária. O celibatário devia desejar sexo, o toque, com cada força de seu ser, mas ele jamais teria a opção de satisfazer sua ânsia.

Até Maddox desfrutava do prazer de estar com uma mulher de vez em quando. Suas amantes costumavam ser as sobras de Paris, mulheres tolas o suficiente para tentar seguir Paris até em casa, na esperança de ir para a cama com ele de novo, mas sem saber que isto era simplesmente impossível. Elas estavam sempre entorpecidas de desejo, já que haviam recebido Luxúria, de modo que raramente se importavam com quem deslizasse entre suas pernas. Na maioria das vezes, elas ficavam felizes em aceitar Maddox como substituto, apesar de ser uma coisa impessoal, tão emocionalmente vazia quanto fisicamente satisfatória. Mas tinha de ser assim. Para proteger seus segredos, os guerreiros não permitiam que humanos entrassem na fortaleza, o que forçava Maddox a levar as mulheres para a floresta que cercava a propriedade. Ele as preferia de quatro, sem olhar para ele, em uma união rápida que não despertaria Violência de forma alguma e nem o compeliria a fazer coisas que fossem assombrá-lo para todo o sempre. Depois, Maddox mandava as mulheres para casa com um aviso: jamais voltem, ou morrerão. Simples assim. Permitir qualquer coisa de mais permanente seria tolice. Ele ia acabar se apegando a elas, e com certeza lhes causaria sofrimento, o que só faria aumentar ainda mais sua culpa e sua vergonha. No entanto, gostaria de apenas uma vez passar mais tempo com uma mulher, como Paris podia fazer. Ele teria gostado de beijar e lamber o corpo inteiro dela; teria gostado de mergulhar nela, perdendo-se completamente, sem medo de se descontrolar e machucá-la. Quando finalmente chegou aos aposentos de Torin, bloqueou estes pensamentos de sua mente. O tempo que ele passava desejando era tempo desperdiçado, como sabia muito bem. Deu uma olhada ao redor. Já estivera naquele quarto antes, mas não se lembrava do sistema de computadores que ia de uma parede à outra, nem dos vários monitores, fones e inúmeros outros equipamentos periféricos. Ao contrário de Torin, Maddox de um modo geral evitava a tecnologia, pois nunca se acostumava com as mudanças rápidas e como cada novo avanço parecia afastá-lo do despreocupado guerreiro que fora um dia. Apesar de que estaria mentindo se dissesse que não gostava das conveniências que aqueles aparelhos ofereciam. Inspeção terminada, ele encarou o amigo. — Dominando o mundo? — Não. Só observando. É a melhor maneira de nos proteger, e a melhor maneira de ganhar algum dinheiro. — Torin se jogou em uma cadeira giratória acolchoada em frente à tela maior e começou a digitar no teclado. Um dos monitores apagados se acendeu, e a tela preta foi se mesclando em tons de cinza e branco.

— Muito bem. Aqui está o que eu queria que você visse. Tomando o cuidado de não tocar no amigo, Maddox deu um passo à frente. O borrão indistinto foi tomando forma gradualmente em linhas opacas. Árvores, ele percebeu. — Lindo, mas não é nada que eu esteja precisando ver loucamente. — Paciência. — Rápido — ele reagiu. Torin lhe lançou um olhar sarcástico. — Já que pediu com tanta gentileza… Tenho sensores de calor e câmeras escondidas em todo o nosso terreno, para que eu sempre saiba quando alguém invadir. Mais alguns segundos de digitação, e a área de visão da tela virou para a direita. Depois, houve um rápido clarão vermelho que apareceu e sumiu. — Volte — disse Maddox, ansioso. Ele não era especialista em vigilância. Não, ele tinha talento mesmo era para matar. Mas até ele sabia o que aquela barra vermelha representava. Calor corporal. Tap, tap, tap e a barra vermelha novamente consumiu a tela. — Humano? — ele perguntou. A silhueta era pequena, quase delicada. — Com certeza. — Homem ou mulher? Torin deu de ombros. — Provavelmente, mulher. Grande demais para ser criança, mas pequena demais para ser um homem. Dificilmente alguém se aventurava a subir a erma colina àquela hora da noite.

Nem mesmo durante o dia. Se isto se dava porque o local era sinistro demais, soturno demais, ou se por sinal de respeito do povo local, Maddox não sabia. Mas ele podia contar nos dedos de uma das mãos o número de entregadores, crianças querendo desbravar o território e mulheres loucas por sexo que haviamencarado a jornada no ano anterior. — Uma das amantes de Paris? — ele perguntou. — Pode ser. Ou… — Ou o quê? — Maddox instigou o amigo, que hesitava. — Uma Caçadora — disse Torin, fechando a cara. — Isca, mais especificamente. Maddox pressionou os lábios, que formaram uma linha tensa. — Agora, tenho certeza de que você está brincando comigo. — Pense. Entregadores sempre vêm com caixas, e as garotas de Paris sempre correm direto para a porta da frente. Este vulto parece estar de mãos vazias e andando em círculos, parando a intervalos de poucos minutos para fazer algo junto às árvores. Talvez plantando dinamite, na tentativa de nos ferir. Ou instalando câmeras para nos espionar. — Se ela está de mãos vazias…

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